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domingo, 7 de novembro de 2010

A VOZ DO SERTÃO


     Quem liga para o nordestino sertanejo, vítima do esquecimento, e alvo de preconceitos!? Ele,  marginalizado e oprimido em pleno sertão nordestino. No entanto, vez em quando, ascende, em vista da situação subumana, o sentimento mais humano, representado na pena deveras do poeta.
     Da cidade de Assaré, no Ceará, ecoam com uma linguagem simples, os versos denunciantes de um dos maiores representantes da cultura popular nordestina, Antônio Gonçalves da Silva, o Patativa do Assaré. Quem não conhece, por exemplo, a canção TRISTE PARTIDA, eternizada na voz do rei do baião, Luis Gonzaga? Pois é, apenas mais uma das jóias do rico baú de tesouro do velho Patativa. (Fábio Rocha)

Opa!Caiu uma jóia!

VIDA SERTANEJA 
  
 Sou matuto sertanejo,
Daquele matuto pobre
Que não tem gado nem quêjo,
Nem ôro, prata, nem cobre.
Sou sertanejo rocêro,
Eu trabaio o dia intêro,
Que seja inverno ou verão.
Minhas mão é calejada,
Minha péia é bronzeada
Da quintura do sertão.

 Por força da natureza,
Sou poeta nordestino,
Porém só canto a pobreza
Do meu mundo pequenino.
Eu não sei cantá as gulora,
Também não canto as vitora
Dos herói com seus brasão,
Nem o má com suas água...
Só sei cantá minhas mágua
E as mágua de meus irmão.
 
Canto a vida desta gente
Que trabaia inté morrê
Sirrindo, alegre e contente,
Sem dá fé do padecê,
Desta gente sem leitura,
Que, mesmo na desventura,
Se sente alegre e feliz,
Sem nada sabê na terra,
Sem sabê se existe guerra
De país contra país.
 
Eu canto o forte cabôco,
De gibão e chapéu de côro,
Que, com corage de lôco,
Infrenta a raiva do tôro
Com um agudo ferrão.
E das noite de São João
Eu canto as bela foguêra

Com seu fogo milagroso,
Segredo misterioso
Das moça casamentêra.

Eu canto o sertão querido,
A fonte dos meus poema,
Onde se iscuta o tinido
Do grito da sariema
E onde o sertanejo véio
Observa os Evangéio
E nas noite de luá,
Sirrindo, alegre e ditoso,
Conta istora de Trancoso
Para o seu neto iscutá.

Sou sertanejo e me gabo
De já tê visto o vaquêro,
Atrás do novio brabo
Atravessá o tabulêro.
Amo a vida camponesa,
Nunca invejei a beleza
E a fantasia da praça.
Eu sou irmão do cabôco,
Que ri, que zomba e faz pôco
Da sua própia desgraça.
 
Cabôco que não cubiça
Riqueza nem posição
E nem aceita a maliça
Morá no seu coração.
Cabôco que, nesta vida,
Além da sua comida,
O que mais estima e qué,
É a paz, a honra e o brio,
O carinho de seus fio
E a bondade da muié.

O que mais preza e percura
O matuto camponês
É não quebrá sua jura,
Que, no casamento, fez.
Sem enfado e sem preguiça,
 
Quando vai uvi a missa,
De paz, amô e alegria,
Leva o seu coração cheio,
Prumode uvi os consêjo
Do padre da freguezia.

E assim, na sua peleja,
Com a famia que tem,
Não inveja nem deseja
O gozo de seu ninguém.
Mas, por infelicidade,
Cronta seu gosto e vontade,
Munta vez, o pobre vê
A muié morrê de parto,
Gemendo dentro de um quarto,
Sem ninguém lhe socorrê.

Morre aquela criatura,
Depois, a pobre coitada,
No rumo da sepultura,
Vai numa rêde imbruiada.
Um adjunto de gente,
Uns atrás, ôtros na frente,
Num apressado rojão,
Quando um sorta, o ôtro pega:
É assim que se carrega
Morto pobre, no sertão.

Fica, o viúvo, coitado!,
De arma triste e dilurida,
Para sempre separado
Do mió de sua vida,
Mas, porém, não percebeu
Que a sua muié morreu,
Só por fartá um dotô.
E, como nada conhece,
Diz, rezando a sua pree.e:
Foi Deus que ditriminou!

Pensando assim desta forma,
Resignado, padece;
Paciente, se conforma
Com as coisa que acontece.
Coitado! Ignora tudo,
Pois ele não tem estudo,
Também não tem assistença.
E por nada conhecê
Em tudo o camponês vê
O dedo da Providença.
 
Só a coisa que o matuto
Conhece, repara e vê
É tê que pagá tributo
Sem ninguém lhe socorrê,
É derramá seu suó,
Com paciença de Jó,
Mode botá seu roçado,
Esperto, forte e disposto
E tê que pagá imposto
Sem ninguém tê lhe ajudado.

Ás vez, alegre e contente,
Quanto é tempo de fartura,
Ele diz pra sua gente:
Nossa safra tá segura!
Mas, de repente, intristece,
Pruquê magma e conhece
Que os home de posição
Só óia para o seu rosto

Pra ele pagá imposto
Ou votá nas inleição.
Quando aparece um sujeito,
De gravata e palitó,
Todo alegre e sastifeito,
Como quem caça xodó,
O matuto experiente
Repara pra sua gente
E, sem tê medo de errá,
Diz, com um certo desgosto:
“Ele vem cobrá imposto
Ou pedi pra nóis votá”.


(Patativa do Assaré)


Outra jóia!!


CABOCLO ROCEIRO

Caboclo Roceiro, das plaga do Norte
Que vive sem sorte, sem terra e sem lar,
A tua desdita é tristonho que canto,
Se escuto o meu pranto me ponho a chorar

Ninguém te oferece um feliz lenitivo
És rude e cativo, não tens liberdade.
A roça é teu mundo e também tua escola.
Teu braço é a mola que move a cidade

De noite tu vives na tua palhoça
De dia na roça de enxada na mão
Julgando que Deus é um pai vingativo,
Não vês o motivo da tua opressão

Tu pensas, amigo, que a vida que levas
De dores e trevas debaixo da cruz
E as crides constantes, quais sinas e espadas
São penas mandadas por nosso Jesus

Tu és nesta vida o fiel penitente
Um pobre inocente no banco do réu.
Caboclo não guarda contigo esta crença
A tua sentença não parte do céu.

O mestre divino que é sábio profundo
Não faz neste mundo teu fardo infeliz
As tuas desgraças com tua desordem
Não nascem das ordens do eterno juiz

A lua se apaga sem ter empecilho,
O sol do seu brilho jamais te negou
Porém os ingratos, com ódio e com guerra,
Tomaram-te a terra que Deus te entregou

De noite tu vives na tua palhoça
De dia na roça , de enxada na mão
Caboclo roceiro, sem lar , sem abrigo,
Tu és meu amigo, tu és meu irmão.


(Patativa do Assaré
 



 

16 comentários:

  1. Brasil de riqueza imensa e que eleva sua cultura.

    Abraços.

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  2. Divinal Poeta Amigo:
    Dois nomes que me eram desconhecidos do "palco" admirável de escritores de nomeada.
    "...Antônio Gonçalves da Silva, o Patativa do Assaré e Caboclo Roceiro..."
    Um post significativo, com que nos presenteia com beleza e encanto gigantes.
    Fiquei a conhecê-los e já os sumariei.
    Parabéns, o seu talento não pára.
    Abraço amigo ao seu génio fabuloso de fazer conhecer enormes vultos da Cultura Brasileira.
    Com respeito e forte estima.
    Sempre a ler a sua notabilidade e oportunidade literárias.

    pena

    Bem-Haja, pela amabilidade no meu blogue que gostei muito.
    Bem-Haja, deslumbrante e talentoso amigo.

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  3. Riqueza imensa de nossa culutura...abraços amigo e uma bela semana pra ti.

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  4. Seus textos, seu blog é um espetáculo, muito bom!!!
    Sou louca para conhecer o nordeste!!!
    Um beijo e uma boa semana.

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  5. F@bio.
    Gosto da tua visita, da tua amizade, das tuas poesias.
    Amei também todo teu carinho e a poesia de Drummond lá em casa.
    Teu texto está lindo.
    Beijo.
    Fernanda.
    *

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  6. Momento ímpar em teu blog caro amigo Fábio, bela homenagem a uns dos poetas mais BEM conceituado do nosso país,com o talento do Patativa a literatura é sempre rica, veleu lembrá-lo. Parabéns - abraços do ALBERTO.

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  7. Fábiooooooooooo, adorei!
    Bjão pra vc meu amigo!
    Gena

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  8. Foi um momento realmente compartilhado com versos mais lindos que já tive a oportunidade de ler. Estou em estado de graça, este Brasil é tão GRANDE em cultura, só sei te dizer que cada verso cada palavra do poeta entraram em meu coração flecha, emoções do principio ao fim. LINDO DEMAIS. Estou sem palavras absorvi toda dor a árdua labuta a simplicidade aparente, uma sabedoria tão profunda, vim com mãos vazias e saio do teu blog segurando o coração transbordando diante de tanta grandeza. Maravilha. Abraços poeta!

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  9. Bom dia Fábio! Maravilhoso Patativa! Respeitado artista que fala com significado poético da vida do seu povo. Adoro!
    Qualquer dia vou postar no meu blog para as crianças conhecerem,
    Abraços,
    Carla Fernanda

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  10. Fabio,
    estou emocionada em ter encontrado um espaço de tamanha riqueza. Seu blog me emocionou, dei uma passeada pelos post mais antigos e confesso que tive a alma tocada a fundo. Beijos de admiração e gratidão.

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  11. Meu amigo, divulgar a cultura nordestina é necessário e ainda falando do Patativa do Assaré, é melhor ainda.
    Obrigado pela visita, deixo um afetuoso abraço, seja sempre bem vindo.

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  12. Eu sou aquele sertanejo em que a alma berra, e os sentimentos pulam, aguça, e avançam rumos aos cantos mais singelos, de um riso empoeirado. Fábio meu respeito e meu apreço pelo seu blog.
    Fique com Deus

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  13. Perfeito, o sertanejo não é apenas um nordestino de sotaque diferente, mas é cultura em tudo que se faz.

    Beijão

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  14. Fábio,

    Como diria Patativa do Assaré, "eu bastante agradeço" a sua iniciativa em trazer à tona a cultura sertaneja, coisa tão nossa e ao mesmo tempo tão discriminada pelos brasileiros.

    As letras são, conforme você mesmo nomeou, verdadeiras jóias. Esses são os poetas da escassez, da seca e da fome, que fazem com que uma dura realidade transforme-se em beleza.

    Beijo,
    Inês

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  15. Querido Fábio,

    Digníssimas jóias raras que nos apresentou!

    A diversidade cultural é sempre motivo de riqueza e alegria. Juntos somos maiores que somados, desde que respeitemos e valorizemos as diferenças e as peculiaridades do nosso povo (povo brasileiro!!). Não há cultura melhor nem pior que outra, as intrigas ocasionadas no pós eleição brasileira é motivo de vergonha e de ignorância. Cultura é cultura, esteja onde esteja e povo é povo sem tirar nem por, aqui e ali, em partes e no todo, não se sai de fininho e culpa (se isentando) de não fazer parte (do povo) e se colocando em posição de superior (isso é alienação das bravas).

    Excelente e oportuno post!

    Um beijo!

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  16. Olá,Fábio! Venho parabenizar-lhe pelo belíssimo blog. Já sou um dos seus seguidores, pois assim como você também me sinto amante da poesia.

    Aproveito para lhe convidar a visitar meu blog. O endereço é:
    www.hugo-freitas.blogspot.com

    Sugestões, críticas, comentários, elogios serão sempre bem-vindos.

    Abraços fraternos

    ResponderExcluir

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